Sem crucificar ninguém

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Mel, fui no último fim de semana assitir ao comentadíssimo filme de Mel Gibson. A polêmica gerada em torno de "A Paixão de Cristo" tem justificativa. Tudo porque o personagem principal é nada menos que Jesus.

Entretanto, a coisa tomou tamanha proporção que falar aqui dos aspectos religiosos que envolvem as polêmicas seria perda de tempo. Primeiro porque é impossível julgar as várias religiões e os povos com suas diferentes crenças e, segundo, porque não há como medir a fé.

Segundo o diretor, Mel Gibson, o filme tenta reproduzir o ano 30 D.C e a vida de um carpinteiro judeu chamado Jesus de Nazaré, que começou a pregar em público e a proclamar, na província romana da Palestina, a vinda de um "Reino de Deus". Durante séculos, o povo judeu esperava a vinda prometida de um redentor conhecido como o Messias - um personagem que restauraria a sua antiga dignidade e que libertaria a sua pátria sagrada de todos os males e desesperos. Muitos acharam que Jesus era esse Messias. Além de doze discípulos que constituiam seu grupo mais íntimo, Jesus começou a atrair um grande séquito proveniente das classes populares da Galiléia e Judéia, que o aclamaram como seu Messias e rei. Entretanto, Jesus tinha também numerosos inimigos em Jerusalém. O Sinédrio, um órgão executivo composto dos principais sacerdotes judeus e de membros do grupo dos fariseus, conspirava para matá-lo.

Com a ajuda de Judas Iscariotes, um membro do círculo mais íntimo de Jesus, o Sinédrio conseguiu prender Jesus, entregando-o para as autoridades civis romanas com a acusação insubstanciada de traição contra Roma. Apesar de Jesus afirmar consistentemente que seu Reino era um do tipo celestial e espiritual, o procurador Romano Pôncio Pilatos, temendo a possibilidade de uma revolta popular, ordenou que Jesus fosse levado para fora da cidade e crucificado como um criminoso comum.

"Eu queria fazer um filme chocante, extremo, que mexesse com o espectador e o filme tem esse efeito sobre as pessoas, de fazê-las ver a enormidade do sacrifício (de Jesus), ver que alguém tenha suportado aquilo e, ainda assim, responder com amor e perdão à dor extrema, ao sacrifício e ao ridículo", diz o diretor.

E realmente o filme é isso: uma sequência de atos bárbaros, expondo à dor uma das figuras mais importantes de todos os tempos. É feio? É. Tem sangue? Tem. Mas a história da Paixão foi assim. E o filme de Gibson pretende tirar todo o romantismo dela.

Não se pode negar que é um belo filme, feito bons atores, falado em latim e aramaico - línguas belíssimas que quase parecem música. Em meio a tanta violência, há pequenos momentos de beleza - principalmente ligados à personagem Maria - que valem o filme.

Há quem acuse o diretor de "culpar" os judeus pela morte de Cristo. Mas nesse filme não há elementos para tanto. Primeiro porque grande parte da população contemporânea a Jesus era formada por judeus - ele inclusive. Segundo porque há uma passagem em que um homem ajuda Jesus em sua tarefa de carregar a cruz. Um homem do povo, temente a Deus, que toma várias chibatadas para ajudar o Cristo. Um judeu.

Um crítico de cinema, Harry Knowles, que viu o filme com uma platéia de agnósticos, escreveu que "se você estiver à procura de anti-semitismo no filme, encontrará". Mas ele considerou uma simplificação reduzir a mensagem de "A Paixão" a um ataque aos judeus como assassinos de Cristo. "A mensagem é sobre um cara que recebe o maior castigo corporal que você já viu na vida e como ele não pede vingança e reza pelo perdão aos que o punem. Eu sou um liberal radical e acho que compreendo a mensagem do filme melhor do que os conservadores", afirmou Knowles.

Talvez seja essa a mensagem de "A Paixão de Cristo": você encontra nele o que quiser. Mas não crucifique ninguém por isso.

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