Poupée

|
Meu quintal já foi bastante grande, um dia. E quem reinava nesse mundo era Poupée, a vira-latas que foi minha melhor amiga por 11 anos.
Se eu era pequena quando ela chegou, minha mãozinha foi o primeiro colo que ela achou, separada da mãe para ir morar no interior, com gente estranha que a amaria para sempre.
Dei nome francês para aquela coisinha branca, com a barriga malhada e cara de fox. Ela dormia em um berço de boneca ao lado da minha cama e, na primeira noite, chorou até que eu cedesse meu espaço e ela se aninhasse no meu pescoço. Ela adorava dormir no pescoço da gente.
Poupée foi meu brinquedo mesmo. No melhor sentido que a palavra pode ter. Foi minha infância inteira, minha adolescência e o começo da vida de gente grande.
Me viu sair da escolinha para a faculdade, seguiu meus passos de dança, me acompanhou nas brincadeiras, nas provas, nas mudanças.
Tenho a impressão que no dia em que ela partiu eu cresci de uma vez só, deixando para trás todos os brinquedos, fantasias, cheiros e tatos que o mundo infantil tinha. Foi um tempo cinza e sem graça, em que tive que redescobrir o jeito de olhar para aquele quintal cada vez menor e lidar com sentimentos novos que me atormentam, e enchem de dor o peito, sempre que sinto a sua falta. E sinto tanto a sua falta. E acho que ela sentiu tanto a minha falta.
Eu nunca vi naqueles olhinhos tão vivos que a despedida estava próxima. E não estava por perto quando tudo aconteceu. Podem me dizer que talvez tenha sido melhor assim, mas o que eu queria nessa vida era tê-la em meus braços mais uma vez.

0 comentários: