Controller

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Piggy é mesmo minha filha. Além dos cabelos pretinhos, de gostar do namorido quentinho, de colo e de sair para longos passeios, ela tem mostrado cada vez mais que tem olhos de revisora: controla cada movimento nosso pela casa e estranha cada alteração, nem que seja uma folhinha caída de um vaso novo. Além disso, vê televisão e aposto que já sabe quem é o filho da Bia Falcão.

A menina e o futebol

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É preciso que uma verdade seja dita: ela não entendia nada de futebol. Nada mesmo, e ria gostoso quando contavam a piada da Maria que perguntava ao marido o que o jogador de preto e com o apito na mão fazia atrapalhando o jogo.
Quando pequena, nas férias, via um avô sempre muito sisudo esquecer da vida diante de um jogo do Palestra. Mas nos outros dias o futebol não fazia parte de sua vida, simplesmente. Sabia que ele existia, mas o deixava quieto em seu canto, como deixaria quieta uma questão de física quântica, e só se lembrava de algumas regras do impedimento quando havia jogo do Brasil na Copa. E quando o avô de olhinhos azuis morreu e foi numa Copa, ela sabia que as visitas seriam mais breves porque haveria jogo.
A partir daí desprezou os campeonatos todos que existem, ignorando mesmo os do campinho em que o irmão ia vez ou outra e os dos meninos que jogavam em frente à escola de ballet, olhando comprido para as pernas das meninas. E foi nessa época, no ano de sua formatura, que ela conheceu o Zé Carlos. Entre tantas afinidades, havia o futebol. Ou não havia, porque ele mal sabia quando era pênalti. E então as tardes de domingo não eram comprometidas nem ao menos por um locutor ensandecido narrando os nomes dos jogadores de cada time entremeados pelos “toca a bola”, “chutou pro gol” e “vai cobrar escanteio” tão previsíveis.
Os dois faziam planos de casar, queriam ter filhos, e a Vila Buarque, em São Paulo, viu nascer o casal mais perfeito que existia, os dois de mãos dadas passeando calmamente pelas ruas depois de uma sessão de cinema.
Mas houve um dia em que ela acordou diferente. Não quis comer, passou o dia na cama. E quando o Zé Carlos chegou à noitinha para namorarem, ela desejou que ele morresse. Pior, o expulsou aos gritos dizendo que ele não era homem de verdade. A mãe chamou a cunhada às pressas e tentaram fazer com que a menina falasse o que tinha acontecido. Em vão. Apelaram então para as orações e, secretamente, fizeram um trabalhinho que a empregada ensinara, para desfazer qualquer mau-olhado que tivesse caído sobre o casal.
Nada adiantava, a menina não queria nada nem ninguém por perto, pensava no Zé Carlos e enjoava. Começaram a dizer pela vizinhança que ela tinha perdido o juízo. Falavam até em internação.
Até que em um domingo uma música invadiu seu quarto e a fez ter vontade de ver o dia. Saiu caminhando sozinha pelas calçadas desertas e cheirando a almoço em família. Seguia o batucar da música, que aos poucos ficava mais forte, dizendo que em uns dias chove, noutros bate sol. Sorria, a menina.
Chegou a um campinho deserto, onde amigos jogavam uma pelada e um grupo ensaiava um sambinha. E lá a menina conheceu Chico e se sentiu completa: o futebol a encontrara.

À francesa

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Acho que é assim que a seleção jogou e está saindo da Copa. Muito de fininho.